
Faço aqui uma breve explanação sobre o significado das atividades do curador e suas diferenças em relação à figura do marchand.
Segundo Nessia Leonzini, na apresentação do livro Uma Breve História da Curadoria, de Hans Ulrich Obrist, “a palavra curador vem do latim curare, que por sua vez chega à nossa língua como curar - na acepção de “cuidar” ou “conservar”: tomar conta das obras de arte.(...) O que fazem os curadores, então? O que mais fazem é olhar a arte e pensar sobre sua relação com o mundo. Um curador tenta identificar as vertentes e comportamentos do presente para enriquecer a compreensão da experiência estética. Ele agrupa a informação e cria conexões. Um curador tenta passar para o público o sentimento de descoberta provocado pelo encontro face a face com uma obra de arte. A boa exposição é feita com inteligência e inventividade; com um ponto de vista.”
Cauê Alves no texto “A curadoria como historicidade viva “ no livro “Sobre o ofício do curador” define de forma direta e simples a figura do curador de arte:
“O curador de arte, ao pé da letra, seria aquele que está incumbido de cuidar, zelar e defender os interesses dos artistas e dos seus trabalhos de arte. O curador, como se sabe, é o profissional que organiza, supervisiona ou dirige exposições, seja em museus ou nas ruas, em espaços culturais ou galerias comerciais.” Dando continuidade ao seu pensamento sobre o curador Alves ainda define a figura do curador institucional:
“O curador institucional não é aquele que coloca em circulação o que apenas agrada, mas é um sujeito que pensa, estuda e reflete. Uma exposição não poderia ser somente uma manifestação pública do gosto individual de um curador, ainda mais quando feita com dinheiro público e em espaço público. A exposição é resultado de uma pesquisa e reflexão individual ou coletiva, ligada ao gosto sim, mas que leva em conta relações e correlações com a vida pública, que diz respeito a juízos ponderados e fundados em critérios que nunca antecedem os próprios trabalhos de arte, mas que são fornecidos por eles. O curador é um profissional que, como o artista, também tem direito à liberdade de pensamento, de expressão, mas que deve obrigatoriamente fazer uso público da sua reflexão, enquanto o artista podia até pouco tempo manifestar seus sentimentos ou gosto sem justificá-los. O uso público da reflexão pelo curador deve ter um sentido que, indiretamente, esteja ligado à história e à vida política.” (página 45) uma outra característica da figura do curador é que essa profissão é consideravelmente recente conforme aponta Olu Oguibe em Artigo Retirado da Revista Concinnitas Virtual. Ano 5 – N.6 – julho de 2004:
“Na segunda metade do século XX surgiu uma nova figura, na posição de agente cultural influente, que acabaria por roubar de modo eficaz a posição suprema da crítica e do historiador da arte no discurso da arte contemporânea. A figura era a do curador, diretor ou comissário de exposições. Entre os anos 70 e 90, à medida que os acadêmicos e críticos se tornaram menos influentes nas decisões sobre o destino da carreira do artista – especialmente na cultura metropolitana –, o curador começou cada vez mais a definir a natureza e a direção do gosto na arte contemporânea.”
Por outro lado, a figura do marchand não tem essa preocupação. A figura do marchand é bastante antiga, ela surge na França do século XVII como um atravessador comercial da produção artística dos pintores para com os seu compradores. Não havendo dessa forma uma negociação direta do artista com o comprador. O olhar do marchand é estritamente comercial, conforme mostram as definições de diversos dicionários: Michaelis on-line diz que marchand é o “indivíduo que negocia com objetos de arte, especialmente quadros”. O dicionário Priberam da Língua Portuguesa diz: “pessoa que negocia obras de arte”. Um outro dicionário, o dicionário.com.br, diz que o marchand é a “pessoa que negocia ou comercializa obras de arte, normalmente quadros: o marchand do museu tem se dedicado a vender arte moderna”.
No Brasil, segundo a terminologia do Ministério do Trabalho, o marchand é designado como agenciador de obras de arte - um tipo específico de prestador de serviços autônomo, com registro legal e exigências normativas fixadas pelas prefeituras de cada município. Trata-se de uma profissão para a qual não há formação acadêmica específica. No entanto, a prática dessas atividades de intermediação e assessoria requer algum conhecimento sobre história da arte e, especialmente, sobre o mercado de objetos de arte e os vários agentes que o constituem.
Assim sendo, observando as definições supracitadas, existe um abismo entre a atividade do curador e a do marchand: um colabora com o fazer artístico e de como o público irá se relacionar com um conjunto de obras enquanto o outro se preocupa somente no lucro e na venda das obras de arte.